
Coluna de Yann Victor (Turma 62)
O fim da clínica (06/05/2014)
Alunos de medicina costumam ouvir a máxima: “a clínica é soberana”.
De fato, uma anamnese bem feita é base para um bom diagnóstico. Isto é, hoje. Mas e se, num possível futuro, a tecnologia na área médica atingisse um patamar que fizesse da consulta médica uma etapa descartável?
O Prof. Evaldo A. D’Assumpção diz, em seu artigo “Decadência da medicina hipocrática”, que a tecnologia, hoje, já se sobrepõe a uma anamnese criteriosa. Para ele, porém, isso é algo negativo e decorrente da má formação médica oferecida por diversas escolas sem preparação. O que mais expressa esse choque entre anamnese e tecnologia é o abuso de pedidos de exames complementares. É verdade que, em muitas situações, uma consulta bem conduzida anula a necessidade de vários exames adicionais que, embora sejam eficientes, custam caro.
O problema de quase toda inovação tecnológica é que esta vem comumente acompanhada de um preço alto. Normalmente, o que é novo se restringe a quem pode pagar. Por isso, a formação de médicos que contam demais com tecnologia avançada é um revés para o cuidado de pessoas sem condição financeira para pagar nem sequer uma radiografia simples.
Saindo do diagnóstico, tem-se a possibilidade de uma tecnologia altamente curativa. Vários filmes futuristas, como Prometheus e Elysium, mostram aparelhos capazes de regenerar tecidos ou realizar cirurgias. Nesse caso, qual seria a necessidade da clínica se há uma máquina capaz de identificar a doença e tratá-la eficientemente? Obviamente, esse tipo de tecnologia pode demorar ou nem chegar ao nível mostrado nesse tipo de filme, que muitas vezes é utópico. Mas, considerando-se a rapidez e a inovação dos avanços vistos nos últimos tempos, a hipótese não deve ser desconsiderada.
Por mais eficiente que a medicina hipocrática tenha sido até hoje, deve-se considerar se o avanço da tecnologia sobre ela traz melhoras para o paciente ou não. A problemática não se situa apenas na parte financeira, mas também na questão humanitária. Uma medicina totalmente regida por aparelhos de diagnóstico e de tratamento traria a mesma eficiência do que um diálogo bem dirigido pelo profissional? Acredito que, se o bem estar do paciente é o mais importante, deve-se valorizar a forma mais certeira de diagnóstico e a mais eficiente de tratamento. Se, algum dia, uma máquina for capaz diagnosticar perfeitamente com custos acessíveis a todos, ela provavelmente substituirá a clássica consulta e trará, com isso, o fim da atividade clínica.